- Já
escrevi ou estou escrevendo. Comecei com dezenove anos, na metade do
curso de filosofia que eu então fazia. Conhecera Nietzsche,
Montagne, Camus que escreviam sobre seus mundos e filosofavam ao
mesmo tempo em que falavam de si mesmos. Achava e acho uma delícia
essa biografia que não se faz da mera narração de gestos
cotidianos e banais, mas vem encaixada no meio da filosofia ou da boa
literatura. Sou um filósofo e filósofos podem ser densos, sérios,
austeros e escrever biografias aos dezenove, como eu.
Acho que há uma graça em ser romântico, em ser romântico hoje.
Escrevi
a primeira parte de minha biografia performativizando
inconscientemente Montagne ou Nietzsche, mas pensando conscientemente
que eu era um filósofo e que podia me levar, sim, à sério e
escrever com esse mesmo espírito de seriedade. A última vez que
reli as 40 páginas escritas nessa época foi há seis meses e não
me constrangi. O estilo é pesado e sem humor, mas aceitável pra um
garoto que só começava a aprender a pensar e a escrever. Não,
nunca fui realmente um prodígio, nem prematuro, apesar de ser velho
desde os quinze.
Não
disse, porém, nada disso na sala. Não surpreendi o professor, que
logo e antes que pudesse receber qualquer resposta, emendou levemente
– vocês têm 23 anos de idade! Quem é que quer escrever biografia
com essa idade! Vocês querem ver futebol na TV! O clima era leve e
galhofeiro, inoportuno para um filósofo e sua seriedade
performativizada.
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