sábado, 12 de maio de 2012

De Tenerife para a sala de jantar

Nas últimas férias, eu e R. viajamos à Tenerife e à La Gomera, duas ilhas vizinhas pertencentes às Canárias. Saramago viveu os últimos anos de sua vida em Lanzarote, mais uma das Canárias. Ali nossas atividades consistiram basicamente em caminhar pela ilha por horas - nesse estilo de viagem e de lazer amado pelos alemães com a mesma intensidade com que é odiado pelos brasileiros - se mexendo, se exercitando, aproximando-se (sic) do próprio corpo, percebendo os músculos e como eles avançam para a exaustão, ao mesmo tempo em que se contempla a natureza da qual também - sim, sim! - se faz parte. Por que brasileiro detesta caminhar? - conclusões de uma relação binacional. Nunca tinha pensado nisso antes. Seria por ser um esforço físico? E esforços físicos estariam relacionados à trabalhos manuais e braçais e, por extensão, a uma situação de vida humilde e pouco privilegiada que os brasileiros desejam negar?

Como brasileiro, posso dizer que talvez negamos e fugimos de imagens que poderiam corresponder a um estilo de vida humilde - como andar a pé ou não ser dono de nenhum automóvel - porque realmente a tal vida humilde é a realidade de milhões de nós ou, se não for mais a realidade, é um fantasma à espreita. Na Alemanha descobri que brasileiro é inseguro de si mesmo e que tem baixa autoestima - ao contrário dos clichês que circulam dentro e fora das calorosas terras tupiniquins. Segundo essa minha teoria seria em razão dessa débil autoestima que brasileiros comprariam carro - desde Freud, isso é óbvio, eu sei, mas o que não é tão óbvio, pelo menos pra mim, é que também segundo minha teoria, brasileiros precisariam comer carne todos os dias por causa dessa mesma insegurança e do pesadelo da "pobreza". De fato, muitos brasileiros são impossibilitados por sua situação econômica de comer carne todos os dias, e aqueles cuja situação financeira permite o acesso diário à dieta carnívora fazem questão de segui-la todos os dias apenas para afugentar o tal fantasma da pobreza - infelizmente bastante real para alguns. No Brasil é preciso muita autoconfiança para não comer carne e muita autoestima para não ser dono de nenhum automóvel. Penso que poucos brasileiros não desconfiariam de um conterrâneo que os dissesse que não tem um carro simplesmente porque não deseja ter. Na Alemanha essa resposta não suscitaria as mesmas suspeitas.

Mas de volta às ilhas, nem achei tão difíceis as caminhadas. Seria a ausência do sol que facilitou as coisas? Seria meu desejo de me afirmar alemão? Seria o amor? Seria simplesmente o reles desejo de fortalecer minhas coxas? Caminhei, caminhamos e na maior parte das muitas caminhadas que fizemos nas duas ilhas, foi agradável sim: o ar era bom, as paisagens, bem diversas entre si e cada uma me interessava em sua singularidade. Decidi ali mesmo fazer um pequeno projeto fotográfico: imprimir em tamanho real alguns caules que encontrasse pelo caminho e fazer uma instalação na sala de jantar. Para isso, não poderia fazer apenas uma foto, pois quando fosse impressa no tamanho desejado e real da árvore - uns 3 metros de altura - ficaria pixelizada. Fiz portanto como que panorâmicas verticais de cada caule, cerca de 6 fotos por caule, que depois foram fusionadas e formaram o caule inteiro. Hoje temos um pouco da flora das Canárias embelezando - com um senso de humor que eu gosto - nossa sala de jantar. Se o projeto for pra frente, o próximo passo serão caules brasileiros!














































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